22 de fevereiro de 2011



Cara patrícia,


Realmente as coisas estão fora de lugar e da tão aclamada ‘ORDEM’


Fevereiro de 2011. Participei do SALÃO DA MARINHA, realizado no centro de convenções de Maceió. Quem promove a arte aqui em Alagoas ultimamente são as forças armadas. Ano passado tivemos a não sei quantésima edição do salão do exército e agora estamos vendo – e participando – do 26 salão da marinha...


Apesar de não afeito a esse tipo de evento, por ser realizado com tanta burocracia militar, resolvi participar, uma vez que tinha algo a dizer e não via, como não vejo a longo prazo, um horizonte mais propício e chegado para falar de assuntos abordados pela minha arte.


Temos visto por todas as partes a violência, não respingando, mas caindo de enxurrada sobre as crianças. Antes o comum eram os filhos enterrando seus velhos pais. Hoje, o comum tem sido pais enterrando seus filhos, quando não os matando. Por isso resolvi chamar a atenção para esses episódios que estamos vendo a toda hora.


        Participei com este trabalho e com dois poemas inspirados nele:







GRAMADO GRIS




Desaba o mundo em terremotos,
Furacões e tsunamis,
Bombardeios, trombas d’água,
Hecatombes e Nardonis


Mostra o mundo suas garras
Derretidas, degeladas,
Cada vez mais afiadas


Mostra cartas, suas farpas,
Diz também saber bater na cara
E jogar o jogo da insensatez,
Da cupidez, da arrogância,
Beligerância, falta de infância,
De distâncias sextandares,
Despejada como lixo pelos ares


Marcham roseirais ao cadafalso,
Murcham emílias belas
Sob o granizo teimoso em não derreter


Ao túmulo margaridas e begônias,
Madressilvas e peônias,
Flores de maio, orquídeas, beneditas
Lírios, hibiscos, boninas,
Sempre vivas desprovidas de vida...
Crisântemos sem casas,
Aguapés e pés de acácias
Adornam faces vitimais da criançada...

Em descompasso, passo em falso,
Tropeçam e caem Isabelas aos pedaços,
Em cachos despetalados
Empalados em gramado gris







Um dia sonhei com Isabela, alguns meses depois da tragédia. Sonhei que ia por uma rua e encontrava seu retrato numa sarjeta. Apanhei-o e, assim que o tive em minhas mãos, a imagem e o papel desfizeram-se... Acordei. Pensei um pouco no sonho e levantei-me, dando início à rotina diária. Tomei o café da manhã para sair, acompanhando minha mulher ao ponto do ônibus, como fazia todos os dias.


Conversando, ficamos esperando o transporte. Percebi, nesse dia, alguma coisa brilhando mergulhada numa poça d’água me chamando a atenção. Quando minha mulher se foi e eu voltava para casa, olhei o objeto que brilhava: era uma fotografia de uma menina mergulhada na sarjeta. Ao lado da foto tinha uma caixa de papelão abandonada e amassada, cheia de recortes de papéis e restos de fitas coloridas.


Meio sem jeito, por causa da quantidade de pessoas ao redor, apanhei a fotografia. Deixei escorrer e levei-a para casa, lavei-a e botei para secar. Não parava um só instante de pensar no sonho que tivera e no fato de ter encontrado aquele retrato, até que resolvi fazer um desenho em grafite sobre papel e desse desenho fiz esse poema, uma pequena homenagem a Isabela:



CACHOEIRAS E LUARES


Recolhi o teu sorriso na sarjeta
E o fiz correr aos cachos
Em cachoeiras de mares
E escadarias de luares


Resgatei os teus cabelos nus
Na umidez de uma alameda
E guardei-os no aconchego
Penumbral de uma gaveta


No escuro vi brilhar,
À luz do teu olhar de pingo d’água,
Silhuetas nas vidraças
De pouso de passarada,
Remo, leme, um cais,
Um pontilhão e uma barcaça...


Colhi as tuas mãos
Na aridez cínzea da rua
Lavei a tua tez
No gotejar tênue da pia


Com lápis, borracha, esfuminho, algodão
Toquei a claridade de uma manhã meio fria,
Com pincel, uma caneta e suspiros de maresia


A riscos de luz de sol,
Num papel de seda pura
Resplandeci em teu semblante                      O
A iluminância da lua...











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